Anestesiologia e a nova realidade da Covid-19

anestesiologista

“A Covid-19 levou a anestesiologia para outro patamar.” Assim começa nossa conversa com o médico anestesiologista Dr. Domingos Dias Cicarelli, coordenador do Curso Preparatório para Título Superior em Anestesiologia – TSA com a Dra. Raquel Pei Chen Chan, oferecido pelo HCX Fmusp.

De fato, a pandemia do novo coronavírus alterou completamente as rotinas de hospitais de todo o mundo, interferindo no modo de atuação e preparo dos profissionais da Saúde de forma incisiva. É fato, porém, que a anestesiologia tenha sido uma das áreas mais afetadas.

“A especialidade é sempre auxiliar, aparece em segundo plano quando temos um procedimento doloroso ou uma cirurgia indicada. O anestesiologista, raramente, tem um paciente especificamente seu e indica um procedimento para ele. Exceções são casos de dor, em que os profissionais especialistas em dor conduzem processos específicos. Mas, de forma geral, esse especialista sempre atua auxiliando o cirurgião”, explica Dr. Domingos.

Com a nova realidade da Covid-19, a especialidade foi alçada a um primeiro plano porque o principal problema é garantir a permeabilidade da via aérea; realiza-se para isso um procedimento chamado de intubação orotraqueal, para que esses pacientes possam respirar e diminuir a sensação de falta de ar.

“Os pacientes chegam ao pronto-socorro com muita falta de ar, oxigenando muito mal o sangue e precisando realizar esse procedimento em uma emergência, em poucas horas e, às vezes, em poucos minutos. O médico mais hábil para essa ocorrência é o anestesiologista, que é quem consegue intubar mais rápido e com mais assertividade”, diz. Além disso, há um grande risco de qualquer profissional se contaminar durante o processo já que o paciente respira muito perto do rosto dos profissionais à sua volta. “Nós, basicamente, precisamos olhar dentro da garganta do paciente para introduzir esse tubo; médicos menos habilitados, menos treinados, têm mais dificuldade de realizar a intubação, demoram mais, podem errar mais vezes e têm mais chances de se contaminar”, completa o professor.

De maneira geral, em todo o mundo, o papel do anestesiologista é ajudar na intubação e fazer parte de um time de resposta rápida, tentando minimizar o dano que a doença causa, como também o risco para os colegas de profissão. Ele é treinado para realizar procedimentos invasivos e cuidar de pacientes graves e, por isso, é muito requisitado. Atualmente, todos os hospitais que atendem casos com Covid-19 querem ter um anestesiologista por perto para realizar as intubações e cuidar desses pacientes nas UTIs.

Há, ainda, o aparelho também conhecido como “carrinho de anestesia”: ele pode substituir o ventilador de UTI porque o aparelho faz essa função, ventila o pulmão do paciente durante a cirurgia. Com a aproximação da pandemia, era sabido que não haveria ventilador para todos os pacientes, então centros cirúrgicos se transformaram em grandes UTIs utilizando os carrinhos como ventiladores. “Tentamos minimizar o déficit de ventiladores que, talvez, os hospitais pudessem apresentar ou realmente não ter onde comprar, e o anestesista é o que melhor sabe manipular os aparelhos”, aponta Dr. Domingos.

Anestesiologista nos grandes centros

“O cuidado que o paciente de uma cirurgia de grande porte exige confere ao anestesiologista que faz esse tipo de procedimento um treinamento e habilidade de cuidar de pacientes graves. Muitos profissionais, nos serviços brasileiros médicos, estavam preparados para atender, mas não em todos; nos lugares mais distantes, muitas vezes por falta de UTI ou por profissionais que trabalham nas UTIs, mas que não são especialistas em terapia intensiva, as exigências desse tipo de paciente, com Covid-19, acabam sendo muito grandes”, explica Dr. Domingos.

Este é um problema de saúde característico do Brasil: a regionalização, a permanência da maior parte dos profissionais e dos mais especializados nos grandes centros. Isso acaba por dificultar muito o tratamento desses pacientes, exatamente porque a doença começou nos grandes centros. “São Paulo, em comparação com Nova York, teve uma resposta mui to melhor, nós nos preparamos mais, tivemos mortalidade menor e um desgaste do serviço de saúde menor, mas isso vale para os grandes centros. Quando vamos para localidades mais extremas, no interior, aí percebemos que os pacientes não tinham sido atendidos em todas as suas exigências pela própria formação dos profissionais que atuam nas áreas e déficit nesses lugares”, assinala.

Anestesiologistas mais presentes

A Covid-19 mudou o cenário quando exigiu o anestesiologista mais presente, tomando conta desses pacientes e tomando frente no cuidado e na realização de procedimentos.

Para Dr. Domingos, a pandemia fez com que fosse dada a devida importância que a especialidade tem na medicina de uma maneira geral: “Como os anestesiologistas eram muito requisitados, muitos que não tinham habilidades ou treinamento buscaram esse aprimoramento, e os profissionais que estão se formando na especialidade percebem a importância de serem treinados no cuidado de pacientes graves”.

Também, profissionais que ficavam mais desocupados durante a pandemia, porque faziam anestesia só para procedimentos menores, perceberam a importância e a possibilidade de voltarem a treinar, desenvolver habilidade para cuidar de pacientes graves, e muitos assim fizeram. Segundo o professor, o cenário trouxe à tona a importância do anestesiologista, trabalhando onde percebe a importância do treinamento no cuidado de pacientes graves e no desenvolvimento e manuseio de tecnologias para poder cuidar desses pacientes.

Este blog já tinha abordado o quão constante é a demanda por atualização em Anestesiologia em janeiro deste ano – mesmo antes da pandemia, essa já era uma questão em alta.

Quero passar no TSA: o que fazer?

Um caminho para quem quer se especializar na área é o curso preparatório para o título; na verdade, ele não é importante só para quem vai fazer a prova, mas pode servir também como um curso de reciclagem.

De fato, o título superior em anestesiologia não é obrigatório; ao fazer residência na área, a pessoa se torna um especialista. Porém, sabe-se que quem tem o título superior, normalmente, é um profissional que estudou mais e tem um conhecimento mais aprofundado a respeito de diversos temas. Além disso, com o TSA, o profissional é reconhecido pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia como instrutor, ou seja, pode ensinar residentes que queiram fazer a especialidade.

Coordenador do curso da HCX, Dr. Domingos ressalta que seu diferencial é ter sido o primeiro a ser oferecido absolutamente online; o aluno pode comprar o curso e fazê-lo em casa ou onde conseguir.

As aulas são oferecidas por profissionais que trabalham com os respectivos temas, totalmente especializados, o que garante qualidade de ensino: “O aluno consegue tirar dúvidas, fazer treinamentos, nós disponibilizamos testes, já utilizados em provas do TSA anteriormente, então ele pode ver como são esses testes, principalmente se estivermos falando da prova escrita do TSA”.

Dr. Domingos acredita que o indivíduo que procura ter esse título é um profissional que estuda mais do que a média dos demais, porque a prova é difícil e exige dedicação. É, assim, um diferencial na formação de alguém que acaba por ganhar um conhecimento maior.

“Se eu tenho um serviço muito bom de anestesia e tenho médicos interessados na especialidade, eu preciso ter instrutores reconhecidos pela Sociedade Brasileira de Anestesiologia, pois é ela quem vai reconhecer o hospital em que você trabalha como um centro de ensino e treinamento, e você poderá ter a residência. O número de residentes também depende do número de instrutores, e são reconhecidos os médicos anestesiologistas que têm o título superior em anestesia. Essa é a importância de ter o título superior”, pontua.