O futuro da Medicina e os rumos do ensino médico

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Em 18 de outubro, é celebrado o Dia do Médico no Brasil e, por isso, o HCX traz aqui uma conversa para refletir sobre o futuro da Medicina e os rumos do ensino médico. Como lidar com as inovações na Educação médica e na rotina? As ferramentas tecnológicas ajudam ou ameaçam o cargo do médico? Quais habilidades necessárias para atender em cenários imprevistos, como o de pandemia que popularizou o teleatendimento?

Quem ajuda a responder estas e outras questões é o Dr. Tiago Lazzaretti Fernandes, Professor colaborador da Faculdade de Medicina da USP, Pós-doutorado USP com research-fellow em Harvard e ortopedista do Hospital das Clínicas.

 

Como o sr. avalia o teleatendimento/teleconsulta, liberado no Brasil com a Covid-19? Tem dado certo? Tem sido positivo para pacientes e médicos?

A publicação do Decreto Federal que regulamenta a telemedicina no Brasil e a resolução do Conselho Federal de Medicina autorizam o atendimento médico durante a pandemia da Covid-19 no Brasil. Essa ferramenta fez com que pessoas que eram excluídas do sistema de saúde pudessem se beneficiar do atendimento médico e de especialistas em áreas remotas e de difícil acesso.

É importante lembrar que a telemedicina não é somente realizada a partir de uma videoconferência. O contato por telefone, ou até mesmo por email ou mensagem, pode ser caracterizado como telemedicina. A troca de informações entre médicos de diferentes regiões, a regulação do atendimento para se evitar que pacientes necessitem ir presencialmente retirar pedidos de exames e a realização de retornos para checar exames são benefícios que vemos no dia a dia e vieram para ficar.

Logicamente, além dos benefícios, existem algumas dificuldades que ainda necessitam ser solucionadas, como o exame físico. Por vezes, a qualidade da imagem por vídeo é deficiente e outros exames não são possíveis de serem realizados. Tem havido muito avanço nessa área de dispositivos, ou wearables, que permitem o exame físico e diagnóstico a distância. Entretanto, estamos passando por um processo que ainda não está finalizado e que acertos e erros acontecerão durante a implementação.

Devemos lembrar, também, que existem regras para o atendimento, incluindo a segurança da informação e a confidencialidade dos dados dos pacientes, sendo necessário ao médico ou ao serviço de saúde utilizar plataformas seguras e certificadas para tal fim.

 

Há médicos que temem perder a vaga para um profissional que ofereça teleconsulta. Acredita que isso possa ocorrer? A telemedicina poderia provocar corte de vagas?

A telemedicina é uma ferramenta que pode ser utilizada pelo médico. Por esse motivo, a presença do profissional continua sendo fundamental. Considerando o presente e o futuro da Medicina, ela passa por um momento de readequação não somente por conta da telemedicina. A nova geração de médicos entra no mercado de trabalho com diferentes perspectivas e necessidade de novas habilidades, mas a promoção à saúde e o foco no tratamento do paciente permanecem os mesmos. Ou seja, a medicina tradicional em que imaginamos um médico trabalhando sozinho e atendendo um paciente no consultório, ainda irá acontecer por muito tempo, mas diferentes formas de atendimento e interações serão previstas para o tratamento desses pacientes e poderá necessitar de uma nova linguagem e aprendizado por esse profissional.

 

Como a inovação altera os rumos do ensino médico?

Dr Tiago Lazzaretti
Dr. Tiago Lazzaretti Fernandes, Professor colaborador da Faculdade de Medicina da USP, Pós-doutorado USP com research-fellow em Harvard e ortopedista do Hospital das Clínicas

Hoje em dia discute-se muito sobre ensino e educação, em que o foco está no aprendizado do aluno. Precisamos fazer uma distinção entre o uso de ferramentas de videoconferência para dar aulas – que simula o modelo presencial, passivo, de aquisição de conhecimento, em que o professor fala e os alunos escutam – e os novos modelos de aprendizado com metodologias ativas.

Nas ferramentas de metodologia ativa, o próprio aluno produz o conhecimento e o professor atua como um tutor para orientar e direcionar a discussão. A retenção do conhecimento é maior, além de possibilitar ao aluno aprender o processo e se motivar a procurar novos conhecimentos, visto que o conhecimento adquirido no presente momento pode não ser válido em um curto espaço de tempo com o avanço das pesquisas em medicina.

 

A Inteligência Artificial também pode ser aplicada à educação médica? De que forma? E como isso beneficia os estudantes?

A Inteligência Artificial pode ser utilizada em diversas áreas do conhecimento. Se entendermos a inteligência artificial ou machine learning como um programa de computador que, a partir de muitas entradas de dados, torna mais precisa ou específica a saída da informação pretendida, o “computador” pode entender qual o assunto que o aluno mais se interessa e disponibilizar conteúdo de acordo com o seu desejo naquela área do conhecimento.

O computador também pode identificar quanto tempo o aluno permanece interagindo com cada conteúdo e propor um ritmo ou período de estudo específico para ele. Considerando esse olhar para o futuro da Medicina, existem sites e materiais especializados para a educação e inteligência artificial que podem ser acessados no site The Tech Edvocate.

 

Atendimento humanizado, mas em teleconsulta. Conhecimento tradicional associado a robôs, softwares e hardwares para obter um diagnóstico ou definir uma conduta. O novo médico precisa se atualizar mais em Saúde ou em Tecnologia? Quais são as habilidades exigidas desse profissional?

A profissão do médico sempre necessitou de constante aprendizado e aperfeiçoamento. Nesse momento, não é diferente. Os profissionais estão se readequando para esse novo cenário que exige mais conhecimentos técnicos para poder exercer a mesma medicina, com foco no paciente e escuta atenta. As ferramentas diagnósticas servirão para auxiliar ao médico na tomada de decisão, mas não para substituí-lo. Por trás das máquinas e dos algoritmos de Inteligência Artificial, existe muito trabalho humano e a interpretação dos dados necessita de um filtro também humano para se evitar erros.

O médico já necessitava de habilidades, ou soft skills, para trabalho em grupo, como, por exemplo, durante uma cirurgia com os outros colegas médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem. Agora, além de trabalhar com profissionais da área da saúde, o médico também necessita colaborar, escutar e aprender com profissionais de diferentes áreas do conhecimento, como engenheiros, programadores, analistas de dados, gestores, pesquisadores e designers, entre outros, para se manter atualizado e relevante nesse novo mercado.