A importância do ultrassom pulmonar nos casos de Covid-19

ultrassom pulmonar covid

Em 18 de junho, o HCX Fmusp organizou um webinar para discutir a importância do ultrassom pulmonar nos casos de Covid-19.

Moderada por Gisleine Eimantas, diretora executiva do HCX, a discussão teve a participação do Prof. Dr. Giovanni Guido Cerri, diretor do Instituto de Radiologia (InRad) e do Conselho de Inovação do HCFMUSP, da Dra. Cristina Chammas, diretora do InRad, e do Dr. Paulo Savoia, médico radiologista do InRad. Eles estão envolvidos em uma pesquisa ainda em fase inicial que compara achados de tomografia e de ultrassonografia de Covid-19, mas que já conta com boa casuística e deve render resultados sólidos em breve.

Inicialmente, o Prof. Giovanni lembrou que encarar uma doença como a Covid-19 foi um grande desafio do ponto de vista diagnóstico. “Graças às experiências chinesas e europeias, estivemos mais bem situados em relação ao tema – é uma doença pulmonar grave, como uma pneumonia viral, e sua extensão tem valor importante para o momento de internação em terapia intensiva. Os métodos de imagem são essenciais para definir a gravidade do quadro, a necessidade de internação e também de tratamento intensivo”, disse.

O Prof. Giovanni ressaltou ainda que o ultrassom pulmonar também tem papel importante nas unidades de terapia intensiva: “Muitas vezes, pela seriedade do caso, pelo paciente estar usando respirador e pela dificuldade e desconforto do transporte do paciente, dá-se preferência ao ultrassom; afinal, o exame permite monitorar a evolução da doença pulmonar. Ele também é importante para punções vasculares e avaliação de outras complicações, como tromboses ou processos inflamatórios abdominais. Assim, ele surge inicialmente para complementar os demais exames de imagem, chega a substituir, em alguns locais, a tomografia, que é o padrão-ouro para determinar a Covid, e torna-se essencial na UTI”, especificou.

Na sequência, Dra. Cristina elencou os benefícios gerais da ultrassonografia: o equipamento portátil auxilia na avaliação à beira do leito, evita o transporte do paciente, especialmente com doença altamente transmissível, e exige, assim, o envolvimento de menos profissionais no cenário, o que ajuda a reduzir a contaminação do ambiente hospitalar.

“É fato que a ultrassonografia pulmonar vem de encontro aos achados da Covid. A doença acomete as regiões periféricas, superficiais, que são mais bem evidenciadas exatamente na ultrassonografia. Estamos fazendo essa correlação, iniciamos uma pesquisa com achados muito relevantes e que estão ajudando no diagnóstico. Em muitos casos, os achados da ultrassonografia têm se mostrado superiores aos do raio x, então isso nos dá um alento”, afirmou.

Ultrassom pulmonar: conceitos e aspectos

Para prosseguir, Dr. Paulo relembrou os conceitos básicos do ultrassom pulmonar: a partir da linha pleural é onde de fato nasce o exame, já que os pulmões são cheios de gás. “Em situação normal, as linhas paralelas à linha pleural também aparecem – chamadas de ‘linhas A’, são artefatuais, mas indicam normalidade. Também, podem aparecer as linhas B – verticais, que saem da linha pleural, elas apagam as linhas A e representam o septo interior ou intralobular espessado, algo muito importante no contexto de UTI”, explicou.

Ele enfatizou também a linha B coalescente, que representa o vidro fosco na tomografia – tem os mesmos critérios da linha B comum, mas é como um feixe, um leque de linha B. “Vidro fosco” na tomografia ocorre quando há um aumento do coeficiente pulmonar maior do que o parênquima normal, porém menor do que os vasos do pulmão.

Dr. Paulo alertou, ainda, para as falsas linhas B – a linha E, de enfisema subcutâneo (vertical, mas não emerge da pleura), e a Z, esta sim vertical e emergente da pleura, mas não bem definida, pois apaga as linhas A. São detectadas em mais de 80% dos pacientes.

Na sequência, apresentou as consolidações pulmonares: são os processos que “hepatizam” o parênquima, geralmente infecciosos, e há substituição do conteúdo aéreo normal por um mais denso, tornando-se caracterizável à ultrassonografia.

Tomografia abre caminhos para o ultrassom na Covid-19

Sobre os achados do novo coronavírus, Dr. Paulo afirmou que, a partir dos achados da tomografia, os da ultrassonografia foram extrapolados: “De 50% a 75% dos pacientes com Covid sintomáticos por dois dias apresentam tomografia e, consequentemente, ultrassonografia normais – serão vistas nesses exames apenas as linhas A. Com o passar do tempo, na ultrassonografia surgem as linhas B coalescentes, também chamadas de B2. Por volta do nono dia, surgem as consolidações”.

Muitos trabalhos surgiram comparando os achados de TC e US, e percebeu-se que há sim uma concordância entre os exames; isso porque o ultrassom demonstra muito bem as alterações periféricas da tomografia.

“O ultrassom ‘casou’ muito bem com a Covid-19 porque a doença tem como achados raros, não típicos: acometimento central do parênquima, nódulos, cavidades, linfonodomegalias e derrame pleural. Naturalmente, essas imagens têm, sim, um diagnóstico diferencial”, reforçou Dr. Paulo.

Ele apenas enfatizou que o ultrassom pulmonar não deve ser usado para rastreamento de pacientes assintomáticos; pode, sim, ser usado para triagem de pacientes com quadro clínico e laboratorial suspeito para Covid-19 se a TC não estiver disponível ou, ainda, em gestantes; pode ser utilizado em pacientes sintomáticos hospitalizados, com raio x de tórax normal e sem TC disponível; e, finalmente, pode ser usado para acompanhamento da evolução dos casos.

Sobre a pesquisa que iniciaram, ele adiantou que já conta com 77 pacientes com ultrassom pulmonar feito e, destes, 61 fizeram também a tomografia de tórax. “A pesquisa está em fase inicial, mas já mostra uma boa concordância entre os achados. A medicina brasileira tem alcançado números de casuística ainda raros na literatura mundial, utilizando a ultrassonografia em casos de Covid-19”, disse.

Inteligência Artificial na Covid-19

O prof. Giovanni ressaltou a importância da Inteligência Artificial (IA) neste momento, e lembrou que, no InRad, há um laboratório na área; devido ao momento, alguns projetos foram acelerados.

“Montamos a plataforma RadVid-19 para receber exames suspeitos de Covid-19 em imagens de TC e raio x. Eles são analisados por IA com coordenação de radiologistas, e o médico que enviou as imagens recebe a resposta se o caso é ou não suspeito, a probabilidade de ser mesmo a doença e a extensão de seu comprometimento pulmonar. Já temos 5.500 casos nessa plataforma, uma das maiores casuísticas do mundo; temos recebido exames do Brasil inteiro. É uma plataforma que foi montada em dois meses com a adesão de grandes empresas, e uma das poucas que contempla desde o armazenamento do caso até a devolução do laudo, o que é um legado”, afirmou.

Dra. Cristina lembrou que não há diagnóstico sem um médico preparado para tal: “Você precisa ser treinado, porque você pode ver, mas só enxergará padrões para aquilo que conhece, ou não conseguirá fazer o diagnóstico. É importante observar os padrões comuns e os que serão achados na Covid-19. Além de fazer treinamento com a teoria, é importante ter um simulado e a prática supervisionada por profissionais” ressaltou. Afinal, educação é a chave para tudo.

HCX e Covid-19  

O webinar sobre Ultrassonografia Pulmonar na Covid-19 faz parte de uma série de encontros virtuais realizados ao vivo pelo HCX Fmusp para ajudar médicos e profissionais de saúde na linha de frente contra o novo coronavírus. Na live anterior, o tema foi “Como treinar e manter as habilidades cirúrgicas durante a pandemia”.